top of page

Os entraves para o desenvolvimento das energias renováveis no Brasil - Parte III

Atualizado: 25 de out. de 2022

PROPRIEDADE INTELECTUAL E PATENTE: REAIS DIFICULDADES PARA A APLICAÇÃO DAS TECNOLOGIAS VERDES?




A busca de tecnologias verdes se tornou indispensável no atual contexto de degradação ambiental, apesar de seus altos custos de utilização e investimento. É acertado o pensamento de que

[...] os impactos causados pela tecnologia constituem na verdade reflexo da utilidade que o homem decide dar a elas... Neste cenário, as tecnologias verdes apresentam-se como uma reação ao uso indiscriminado que até os dias de hoje se fez das tecnologias.
Só recentemente se compreendeu que a natureza não é desordem, passividade, meio amorfo – constitui uma totalidade complexa; e que o homem não é uma entidade isolada em relação a essa totalidade... Trata-se de fazer emergir a ciência do homem e, simultaneamente, de fazer nascer uma nova concepção da ciência que conteste e perturbe as fronteiras estabelecidas, as pedras mestras dos paradigmas teóricos e da própria instituição científica.

A tecnologia é entendida como conjunto de conhecimentos técnicos que se aplicam a um determinado ramo de atividade industrial/comercial. Os países desenvolvidos investem grandes somas de dinheiro para a produção dessas tecnologias e, como meio de proteção, recorrem às patentes. Estas são consideradas formas de proteção à propriedade intelectual, são análogas a um contrato entre a sociedade e os inventores e garante a estes o direito de impedir, por determinado lapso temporal, que outros fabriquem, usem ou vendam seu trabalho intelectual. Já os países em desenvolvimento, sem possuir o investimento em tecnologias e pesquisas nivelado com aqueles, são tidos normalmente como receptores dessas invenções, possuindo uma posição aparentemente confortável que gera desconfianças dos produtores. Karina Correa Pereira ressalta essa diferença de conceitos e afirma que

[...] por essa razão, o que acontece na prática é que países desenvolvidos olham com muita cautela para os países em que pretendem licenciar ou transferir suas tecnologias e impõem o maior número de restrições possíveis para que possam se assegurar de que seus contratos sejam respeitados, uma vez que desconfiam da capacidade dos governos locais de colocar em prática a legislação que está no papel.

É problemático, porém, pensar numa mera transferência de energia se essa não vier acompanhada de incentivos à indústria e à pesquisa. No entendimento de José Carlos Vaz e Dias, contratos de transferência são acordos verbais ou expressos que visam o desenvolvimento de inovações, exploração temporária de direitos e, também, o ensinamento de conhecimento técnico para terceiros.A posição de países como o Brasil é de que a proteção do direito imaterial dos criadores dessas tecnologias constitui empecilho à proteção ambiental. Já países desenvolvidos, como os Estados Unidos, defendem que isso incentivará a criação de novas tecnologias e sua posterior transferência. Essa colisão de conceitos é o que se caracteriza como o verdadeiro entrave ao desenvolvimento sustentável. O ideal seria não uma mera transferência contendo um lado criador e outro lado receptor, mas sim um compartilhamento de tecnologias e ideias.

É impensável a propriedade intelectual desvencilhada de impactos sobre a população miserável do globo. Entretanto, é necessária a proteção do direito dos inventores, tendo em vista que este é o incentivo aos pesquisadores para a criação de novas tecnologias. À cooperação entre o público e o privado resta o papel de atenuar esse conflito e de “levar a humanidade à superação destes problemas e ao desenvolvimento conjunto de todas as nações, garantindo a própria sustentabilidade dos seres humanos.”

O País tem investido nos últimos anos em pesquisas nas áreas de tecnologias verdes, entretanto, por não ser pioneiro nessa área, tem enfrentado certas dificuldades concernentes à proteção da propriedade intelectual alienígena. Com isso, para a propriedade imaterial não constituir um entrave ao desenvolvimento sustentável, no pensamento de Marcos Wachowicz, Heloisa Medeiros e Amanda Madureira, é necessário repensar seus princípios justificadores e assim atribuí-la nova legitimidade, sendo submetida ao requisito do desenvolvimento sustentável.


3.1 LICENCIAMENTO COMPULSÓRIO DE PATENTE


Invenção caracteriza-se por um aperfeiçoamento de certa ideia ou técnica. Já descoberta é “a revelação ou identificação de fenômeno existente na natureza, alcançada através da capacidade de observação científica do homem, atribuindo às descobertas a qualidade de constituir a herança da humanidade.

A propriedade, tida na concepção romana como o jus utendi fruendi et abutendi, recebe restrições no direito moderno devido à sua função social, estabelecida pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, XXIII. Ressaltando esse aspecto, há pressões por parte dos países em desenvolvimento para o compartilhamento de tecnologias dos países detentores das mesmas.

O licenciamento compulsório, vulgarmente conhecido como quebra patentária, é visto por alguns como forma de aplicação da função social da propriedade. Este deve ser utilizado conforme o interesse público e os acordos internacionais, ressaltando assim que o princípio da proporcionalidade (interesse coletivo x proteção da propriedade) é o norteador da sua utilização. Sua legitimidade pode ser retirada do texto constitucional que em seu artigo 173, caput, aduz: “[...] a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo [...]”, além do seu parágrafo 4º: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário do lucro.”

Resta agora analisar se o licenciamento compulsório de tecnologias verdes atende ao imperativo do relevante interesse coletivo e da segurança nacional. Além de sopesar se compensa colocar em risco a confiança já abalada dos países desenvolvidos por uma licença “outorgada”. É importante ressaltar que se deve superar o entendimento que apenas países em desenvolvimento o utilizam, uma vez que há vários registros de países como os Estados Unidos que se valem desse instituto. Milton Barcellos ressalta que

[...] o uso procedimental correto do instituto da licença compulsória certamente elevará as qualidades do Brasil como um País que cumpre os Acordos Internacionais, mas que não é submisso às pressões comerciais impostas pelos Países desenvolvidos e seus nacionais.

O investimento em tecnologias renováveis é, indubitavelmente, de interesse da população. Entretanto, é possível a existência de sacrifícios injustos realizados por uma inoperância no cumprimento do exigível dever estatal. Também, é possível que a proteção do direito imaterial constitua real empecilho ao desenvolvimento sustentável. Com isso, cabe ao governo o sopesamento dessas duas realidades para posteriormente tomar decisões. Ao analisar o histórico de licenciamentos compulsórios realizados pelo País, percebe-se que foi utilizado primordialmente nos casos farmacêuticos, ressaltando assim que o Brasil ainda precisa fazer reais investimentos em pesquisa de energias renováveis para poder depois pensar no cabimento desse método.


Referência: https://jus.com.br/artigos/58916/os-entraves-para-o-desenvolvimento-das-energias-renovaveis-no-brasil

Comments


bottom of page